Matheus Gomes, estudante de História/UFRGS
Na madrugada do último dia 19 a Brigada Militar cometeu mais uma ação covarde: pulou o muro e invadiu a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, agrediu brutalmente diversos estudantes que participavam do 98º Conselho Nacional de Entidades de Enfermagem, quebrou os celulares dos que tentavam filmar as cenas de abuso, deteve inclusive os seguranças do Campus Olímpico, enfim, afrontou a UFRGS atuando sem autorização em território federal e o conjunto do movimento estudantil, transformando a confraternização de uma atividade política numa batalha completamente desigual entre policiais e estudantes. Tudo isso justificado pela realização de uma festa que, supostamente, estava incomodando a vizinhança. Inicialmente os policiais conversaram com os responsáveis pela festa e o volume do som foi diminuído. Porém, alguns minutos depois, três viaturas da BM chegaram no local afirmando que existiriam mais 10 reclamações com relação ao barulho. Ora, logo o local que recebe as maiores festas realizadas dentro da UFRGS estaria gerando um grande incomodo num evento com menos de 100 pessoas? Não nos parece que isso seja coerente. A possibilidade mais aceitável, infelizmente, é que a ação da BM foi mais uma armação para criminalizar o movimento estudantil. Agora, temos mais quatro ativistas sendo processados por desacato, desobediência, resistência à prisão e dano ao patrimônio público, resultado de uma ação claramente forjada.
A ação violenta da BM exige uma resposta à altura do movimento, mas também abre debates importante sobre o tema da segurança dentro e fora da universidade.
Educação não é caso de polícia: uma política para o problema da segurança na UFRGS
Que a UFRGS sofre com a questão da segurança não é novidade para ninguém, pois, infelizmente, casos de estupro, roubos de carros, furtos em salas de aulas, são questões conhecidas e recorrentes na universidade. O descaso começa pelas condições de infraestrutura: a iluminação no Campus do Vale e nos arredores da Saúde e do Centro é muito precária; há exatamente 20 anos não é realizado concurso público para o cargo de segurança universitário e a maioria do contingente hoje é das empresas terceirizadas, que fazem prioritariamente a segurança patrimonial. A realidade é que a UFRGS nos últimos anos tem caminhado sob uma lógica que a separa do conjunto da população. O muro no Campus do Vale é o maior exemplo: a comunidade é impedida de entrar em contato com o mundo acadêmico sob a justificativa da violência, mas qual seria o papel da universidade no combate a essa mazela social? Se fechar numa bolha ou produzir uma aproximação entre o local de produção de conhecimento e a comunidade, com projetos de extensão, abertura das bibliotecas, laboratórios e etc? Uma política de segurança para a UFRGS passa primeiro pela resolução dos problemas históricos de infraestrutura e pelo fortalecimento do caráter público da universidade, para torná-la um espaço de referência para toda a população.
O fato ocorrido no Campus Olímpico nos deixa com mais certeza de que a resolução do problema não passa pela intervenção da Brigada Militar na universidade. Educação não combina com polícia, pois essa instituição age sob a lógica da força, não funciona pelo diálogo, o respeito, não atua visando a segurança do conjunto da população, mas apenas de um setor dela: a burguesia e os políticos corruptos. É quase desnecessário criticar a polícia hoje: cerca de 62% da população brasileira é a favor da desmilitarização da segurança pública, as UPPs estão sendo questionadas nas Favelas do Rio de Janeiro e, depois das manifestações de junho, ficou mais que evidente o papel repressor que cumpre essa corporação. Polícia não é sinônimo de segurança, mas sim de violência. Estudantes, técnicos-administrativos e professores da UFSC, USP, UNESP, UNICAMP, UERJ e outras instituições já travaram lutas contra a PM nos campi, esperamos que a reitoria da UFRGS não opte por esse caminho como já foi cogitado, mas se o fizer, estaremos na primeira fileira do combate a essa medida.
Até o momento o Reitor Carlos Alexandre Neto não se posicionou de forma clara contra o ocorrido e pior, ainda afirmou que a UFRGS sempre teve uma boa relação com a BM. Nada estranho para o Reitor que em 2010 reprimiu duramente a ocupação da Reitoria e mandou a BM cercar o Campus Central. Já o DCE, que defende a BM nos campi, até o momento está calado: nenhuma nota, parece estar satisfeito e não ter nada a declarar. O movimento estudantil já começou a responder com o ato de sexta (25) e a convocação de uma nova mobilização para o dia 30. É a hora de mobilizar os estudantes com assembleias por cursos, panfletagens, passagens em sala e exigir ações concretas da reitoria e também do governo Tarso, que é o chefe maior da BM e responsável pelas ações de criminalização do movimento social no estado.
A desmilitarização da PM é uma pauta do movimento estudantil
Em nossa opinião, para além de exigir uma política de segurança para a UFRGS que exclua a BM, é necessário que o movimento paute a questão da desmilitarização das polícias no Brasil. O grande entulho deixado pelos anos de chumbo da ditadura foi a polícia. Institucionalizada em 1969, a Polícia Militar é parte da reserva do Exército Brasileiro e peça fundamental de uma “democracia” que criminaliza os movimentos sociais, os rolêzinhos da juventude de periferia e mata as Cláudias, os DGs e Amarildos sem dar explicação. Em nosso estado o histórico da BM é ligado ao século XIX: ela surge como um instrumento da luta dos Republicanos contra os Federalistas (Maragatos e Chimangos), ou seja, já surge como um instrumento militar ligado as elites e preparado para guerras e enfrentamentos. Uma corporação com esse histórico nunca irá garantir a segurança pública. O movimento estudantil deve assumir com força essa bandeira, agitando com força a desmilitarização da polícia, o fim da tropa de choque e a necessidade da construção de uma força de segurança controlados pelos trabalhadores e o povo pobre!